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sábado, 24 de dezembro de 2011

Berço de Ouro Bacia de Palha; Um outro Natal


Estranhos ritos celebram um perigoso dia.  Em um mundo onde as pessoas buscam posições, curiosamente festejamos o dia em que aquele que era sobre todos ousou nascer como aqueles que eram os menores de todos. Paradoxalmente, o Rei Deus não nasceu em berço de ouro, mas em uma bacia de palha.

O perigoso dia, hoje celebrado por muitos (quem tem pra gastar), foi esperado com terror e medo pelo poderoso Herodes. Inacreditavelmente ele temia que o nascimento de uma criança ameaçasse a sua posição. Só tem medo de perder sua posição de poder quem está nestes espaços, e para preservá-la, até hoje, crianças são mortas. Faz um ano que para garantir apoios políticos e a manutenção da posição do seu partido, a presidente Dilma trocou o projeto que enchia de vida o semiárido pelas cisternas de plástico de gordos empresários. Algumas crianças pobres talvez sobrevivam às opções políticas do PT.

O Poderoso Deus percebeu que enquanto lutava para manter a sua posição com leis, mandamentos, sacrifícios, dilúvios e chuva de enxofre, as pessoas continuariam morrendo, mortas por Ele, ou por aqueles que nasciam em berços de ouro. Logo viu que para salvar a sua criação e salvar a si mesmo dos ônus do poder seria necessário nascer outro, e assim fez. Deus nasceu outro, nasceu desapoderado, criança frágil, humana. Nasceu em uma bacia de palha.
O nascimento do frágil e desapoderado Deus é perigoso porque empodera os pequeninos, dá esperança aos fracos, ameaça qualquer poder estabelecido, desautoriza as pretensões dos nascidos em berços de ouro ou dos que gastam os seus dias preservando e disputando posições de entrarem no seu Reino, mas fácil seria um camelo passar pelo fundo de uma agulha.

Enquanto o Deus Mamom mascarar o Natal ele continuará esvaziado de sentido. Enquanto não retirarmos as vendas que nos cegam - o individualismo, o consumismo, a sede por posição e poder, o natal não será um dia perigoso para a política, para a religião que aliena e imbeciliza seus fiéis, para os ricos cevados que nos empurram suas cisternas de plásticos que se deformam e deformam projetos e sonhos de um semiárido menos injusto.

O dia do Natal é a celebração da chama de Deus no mundo, luz que ilumina a realidade, fogo que aquece nossos corações com a esperança de um mundo melhor. Chama  Sagrada que enche de cor e alegra nossos caminhos.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Caminhos de um amigo Errante...

Homenagem ao errante Marcos Monteiro pelo seu aniversário de 60 anos!!!


Cheguei ao Seminário procurando caminhos. Com um mapa rasurado embaixo do braço, alegrava-me com meus companheiros quando recebíamos de nossos professores lupas novas. Sempre acreditávamos que com a nova lupa recebida encontraríamos o caminho certo, foi aí que em um desses caminhos topei com ele, um Errante. Mandaram-me ter cuidado, pois o errante caminhava na direção oposta a que eu precisava seguir, insisti em acompanhá-lo, pois esse errante parecia seguir um outro, Jesus de Nazaré. Rapidamente percebi que não havia caminhos, ele não caminha pelo caminho oposto, ele corajosamente desbrava caminhos. Era preciso desatar minhas asas e reaprender a voar, pois certamente diante de abismos ele não recuaria.

Com uma inteligência impressionante, Marcos escolheu viver uma vida simples, perto dos menores.  Desconfio que somente dos espaços de exclusão há chance de termos uma visão límpida da realidade e de nós mesmos.   Extremamente apaixonado por pessoas, sempre faz da oportunidade de encontrar e conhecer pessoas uma oportunidade de encontrar o Pai.
Certa vez, estava numa reunião de fundação de um grupo de identidade evangélica, que atuaria em âmbito nacional no campo da política, estavam lá muitos líderes e um deles era Marcos. No momento da apresentação, como de praxe, cada um falou seus títulos – doutorado no exterior era fichinha, comecei a achar que não era para eu estar ali, olhei pro lado e comentei com meu amigo Leo, calouro em Teologia: _Ei rapa! A gente vai falar o que? Leo rio, ele, pelo menos, era pastor da Igreja Batista em Morro de São Paulo. Na hora de Marcos, ele disse: _ Meu nome é Marcos Monteiro, sou amigo de Marquinhos e de Leo. Depois disso eu já sabia o que falar...
Marcos amigo é também mestre, desses que ensinam coisas essenciais, jogar dama, sinuca e ter bons olhos. Meus olhos viciados olhavam para lugares altos, os olhos de Marcos contemplam outros lugares, conseguem ver beleza e vida em lugares que poucos enxergam. O errante mestre e amigo é também um agitador, agita mentes, idéias e ideais com seu discurso sempre engajado, mas principalmente agita almas através do discurso mais impressionante que já ouvi de Marcos, sua vida.
Quando terminei o curso de teologia Marcos convidou-me para compor o colegiado pastoral da Comunidade de Jesus. Marcos é apaixonado pela vida, pessoas assim não têm tempo para gastar com meandros burocráticos de Instituições. Na primeira reunião que tive com Marcos para tratar dos assuntos da Comunidade, comemos, bebemos e nos intervalos das prosas falávamos sobre coisas mais sérias. Eu anotava tudo, estava determinado a escrever cada palavra que o mestre diria, e conhecer as minhas tarefas. Saí da reunião com uma lista, era uma lista de nomes de pessoas, muitas pessoas, pessoas que participaram da Comunidade que estavam longe, outras que estavam perto, pessoas que eram referencias para a Comunidade, nenhuma tarefa, pessoas, pessoas e pessoas...     Terminarei por aqui esse texto porque preciso ver meu amigo atrapalhado, que certamente vai errar o caminho quando vier em minha casa, e não vai lembrar onde deixou os óculos depois do estudo bíblico de terça, mas que continuará desafiando-nos a, de mãos dadas, encontrar, perceber, seguir, atravessar, cortar, dançar, celebrar caminhos que só olhos bons e atentos às coisas essenciais conseguem enxergar.

Parabens Marcos! grande privilégio caminhar contigo...


Feira de Santana, 20 de agosto de 2011.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Desejo, amor e posse

Errante, sem nada carregar, nem mesmo o medo de me perder.
Num mundo de barulhos e pressa, vi desejos.
Vi o mar... No mar da vida, todos nadam sedentos por novas propriedades.
Mas logo a nova propriedade, se tornará velha, e virá o enfado e novos desejos...
Desejamos aquilo que está fora do alcance das nossas mãos.
Não desejamos o que já está no bolso.
Já me pertence, já é meu... A ilusão da posse trapaceia.
Só desejamos possuir aquilo que ainda não temos.
Nietzsche perguntou, não respondeu. “Não será o amor uma ânsia por nova propriedade?”
Amor? ...ou posse? Amor e posse?
O amor carece de desejo, de paixão...
Se o outro não é nossa propriedade, pode continuar despertando desejo.
Se o outro não é propriedade, o outro é também sujeito.
O desejo faz o amor se transformar em árvore frondosa, a posse o transforma em mato seco.
Eu vi... um campo de mato seco, por lá ninguém desejava passar, nem mesmo aqueles que fizeram das árvores, mato..
Eu vi... o aconchego, os frutos e a sombra de uma bela árvore frondosa.
"Enquanto tiveres um desejo, terás uma razão para viver. A satisfação é a morte." Bernad Shaw

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Mosaicos

Você é uma pessoa única, não há ninguém em todo o universo como você. Essa singularidade e nossa incrível diversidade nos fazem humanos. Deus nos fez assim. A diversidade humana nos torna belos, torna o mundo colorido, repleto de sabores, cores, sons e sentidos vários.
A beleza da diversidade nos tornou seres encantados e teimamos em ser muitos, cada um de nós somos vários: Somos Caeiros, Ricardos, Anas, Messias, Capitus. Somos muitos, apenas um; Mosaicos. Cada um desses que existem dentro de nós mesmos tem sua força, e juntos somos fortes. Somos fortes quando essa multiplicidade e diversidade, que se chama Eu, encontra-se com outra pessoa e lhe dá as mãos.

Um grande poder vem ao encontro de tudo isso, poder que não deseja a diversidade, mas a igualdade, a padronização. Para utilizar as pessoas, para ter poder sobre elas, elas precisam ser iguais, massa humana. Nietzsche chama essa massa de Rebanho, Foucault chamou de Sociedade Disciplinar, a Igreja chama de fiéis, a escola de alunos, a fábrica de empregados, o estado de cidadãos.
Essas forças nos enfraquecem porque violentam nossas características mais essenciais, àquelas que nos torna diferente dos outros, que nos fazem nós mesmos. Essa violência é sutil, se apodera dos discursos, constrói verdades que guiam nossas mentes e domesticam nossos corpos, drenam as energias que deveriam estar a serviço da vida, do prazer, do gozo, da alegria, para servir à manutenção de um tipo de sociedade eleita por alguns, aqueles que lucram com ela, como a ideal.

Onde há poder há resistência. Cedendo ao forte apelo da Sociedade Disciplinar alguns de nós caminha como rebanhos de carneiros bem comportados, obedientes, ignorantes, imbecilizados. Outros resistem, se arriscam a manter um de seus Eus diferente do padrão: anormal, estranho, devasso, subversivo, pecador.
Quando eu era menino lutei contra tudo que havia em mim que não atendia às expectativas ou seguiam as normas da sociedade cristã ocidental. Hoje tento voltar catando os cacos do melhor de mim que ficou pra trás. Quem sabe os cacos sirvam para refazer o mosaico.

domingo, 22 de maio de 2011

Um mundo em Preto e Branco

Quem me dera um mundo livre de todo mal
Onde todos, e cada um, fossemos iguais.
Quem me dera se todos os caminhos fossem apenas um.
Onde a verdade fosse percebida e interiorizada sem questionamentos.
No mundo inteiro imperaria uma única fé: A fé cristã.
Quem me dera se os países se curvassem diante da Democracia Ocidental.
Onde o governo é de todos e para todos.
E que o terrorismo islâmico e as ditaduras fossem dizimadas.

Quem me dera um mundo com apenas um Deus. Senhor de tudo e de todos.
Queria que você viesse comigo e contemplasse um mundo sem homossexuais. Sem coloridos.
Onde toda confusão fosse banida. Sem bebidas, sem orgias, sem festas...
Você pode ver? O bem imperaria sobre o mal, o destruiria...
Não haveria opiniões porque todos conheceriam verdades absolutas.
Quem me dera um mundo com apenas uma cor: o branco e o preto.
Só haveria uma forma de amar...  Uma forma de ver...
Apenas uma forma de sorrir.
Mundo de Obamas sem Osamas, de Israel de Deus, sem Palestina.
Sem Candomblé, sem Orixás. Sem beijos roubados só concedidos.

Quem me dera um mundo sem paixões. Sem palavrões.
Os diversos temperos seriam banidos... E o sexo só papai talvez mamãe.
A família seria o centro balizador desta sociedade. E as mulheres, suas guardiãs.
Você pode enxergar? Um mundo sem pecados sem transgressões
Sem erros ou falhas... Mundo sem masturbação...

Sem gozo... Só procriação... Preto e Branco...
Quem me dera um mundo livre de todo esse mal...


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* Imagem do filme Pleasantville; a vida em preto e branco...

domingo, 15 de maio de 2011

HOMOSSEXUALIDADE E LIBERTAÇÃO HUMANA

Por Marcos Monteiro

O momento apaixonante merece um texto apaixonado, mas somente os poetas tem a habilidade de sugerir vertigem e volúpia pelo entrelaçar das palavras. Como não sou poeta celebro em texto comum a decisão do Supremo de legalizar o legítimo direito dos homossexuais de constituir amor e família. Desses instantes que fazem jus a festa, dança e feriado nacional. Caíram as cercas da praça, mas o povo desacostumado não consegue invadir o espaço para deitar na grama, girar na roda gigante ou dançar ciranda.

A unanimidade da decisão nos surpreendeu, embora o nosso tribunal maior apenas reconheça um direito já exercido por mais de dez milhões de brasileiros. Maneiras de reconhecer a humanidade de minorias. Ser humano é ir se estabelecendo na diversidade e na inconclusão. Os diversos modos de se amar, a exuberância de uma sexualidade que se estabelece sem respeito a regras e manuais, são expressões legítimas dessas diferenças que transformam a paisagem humana em poesia e beleza.

Homossexualidade é palavra que tenta definir o indefinível, pretendendo retirar do ser humano parte de sua humanidade. Faz pouco tempo, comemorava em um restaurante um aniversário, na companhia de amigos e amigas, a maioria rotulada como gays, lésbicas, ou palavras semelhantes. A comida e a bebida eram comuns e a conversa girava sobre história, poesia, literatura, futebol, religião, sexo. Cardápio variado de comida e de conversa, duas coisas do cotidiano de todos os seres humanos.

Ter direito ao pão de cada dia garante a sobrevivência, o direito ao sexo de todo dia ou de vez em quando transforma a sobrevivência em poema. O sexo é esse momento de ultrapassar limites, em que o corpo se propõe como lugar de mistério e de arrebatamento. Vivido amorosamente acrescenta à volúpia do carinho a profundidade da doação livre e mútua, entre dois seres humanos livres e disponíveis. O direito legítimo à carícia e ao amor é agora legalizado como pertencente a todo ser humano, sem a necessidade de rótulos.

Sem as cantigas das comemorações, o ruído dos protestos são feitos em nome da família e da religião. Novamente a questão das definições. Se família significa entre outras coisas o espaço para o crescimento mútuo de seres humanos e para o cuidado e educação de crianças, esses espaços são diversos, com diversos atores atuando em diversos papéis. Crianças criadas por pais ou mães do mesmo sexo não se tornaram necessariamente frustradas, drogadas ou marginais, nem mesmo homossexuais, terror de muitos.

Alguns religiosos se pronunciaram a favor da união estável mas não do casamento, prerrogativa das igrejas. Na sutileza semântica, a complicação lingüística. Carícias e palavras não podem ser patenteadas, a pretensão apenas convida à continuidade da luta. As religiões e as igrejas não são concessionárias das cerimônias nem proprietárias de Deus. O direito de crer (incluindo o direito de não crer) e o direito de amar são prerrogativas tão humanas quanto o direito de comer e de conversar.

Para os que pertencem ao campo religioso, como pertenço, a decisão do Supremo é oportunidade de aprofundamento, de busca de compreensão e de ressignificação. Livros, artigos, pesquisas, estudos densos sobre a sexualidade humana já são abundantes. Acima disso, o ser humano concreto, pessoas que vivem amor e sexualidade de modos diversos. Muitos que experimentaram sentimentos de alegria e de libertação quando assumiram a sua maneira de amar; muitos que não se sentem abandonados por Deus. Pelo contrário, diante da maldição de todos, somente contam com o sentimento da compreensão Dele, no espaço indevassável de sua interioridade.

Diante de tudo isso, podemos assumir vociferantes o papel de arautos da culpa, da vergonha e do remorso, ou celebrarmos a boa notícia (evangelho) da libertação e nos juntarmos à alegria de milhões de brasileiros e brasileiras que se sentiram acolhidos e protegidos pela lei, pela primeira vez na história. Por estranha e feliz coincidência este texto está sendo postado em um novo e diferente treze de maio.

Outros textos de Marcos em seu Blog: http://madoniram.blogspot.com

terça-feira, 3 de maio de 2011

DEUS sem o DIABO - Morre Osama Bin Laden

O mundo Ocidental triunfa sobre as hostes do mal. Morre Osama Bin Laden.
As cenas ridículas de estadunidenses alienados gritando U.S.A  na frente da Casa Branca comemorando a Morte de Bin Laden,  se repetiram durante todo o dia.

Mas as outras mensagens aquelas que não são ditas, mas se dizem, aquelas que costuram os discursos, que estão por trás destes, nas entrelinhas essas são interessantes.

Os Estados Unidos atestam sua vocação para matar, e não poderia ser diferente. No mundo Ocidental os maiores lucros, que equilibram a delicada economia vêm de crimes (narcotráfico) e das indústrias da morte (armas). Nunca houve tanta concentração de recursos econômicos e conhecimento científicos e tecnológicos dedicados a produção da morte.

As fábricas de armas estadunidenses só não trabalham mais que as fabricas midiáticas de produção de inimigos.

O mundo Ocidental que o tal Bin Laden tanto odiava luta pela paz enquanto os radicais islâmicos terroristas promovem a Guerra. Os números mostram bem isso: [1]Para cada dólar que as Nações Unidas gastam em suas missões de paz, o ocidente emprega 2 mil dólares em gastos de guerra, destinados ao sacrifício de seres humanos em caçadas onde o caçador e a presa são da mesma espécie.

As últimas notícias do assassinato de Bin Ladem e sua família no Paquistão trouxe à memória dos estadunidenses o ato terrorista de 11 de setembro q quase 3 mil pessoas em sua maioria civis foram mortos. A nação alienada certamente não consegue lembrar do ato de Terrorismo em que 60 mil civis Iraquianos foram assassinados, famílias inteiras dizimadas,  mortos na guerrinha de Bush no Iraque, para procurar algo que não existia.

Na guerra do Afeganistão, aquela que começou para caçar Bin Laden e que continua até o momento, mesmo depois da morte do Demônio, só em 2010 foram 2777 civis afegãos mortos.
O ex inimigo numero 1 do povo da Guera, foi também o homem q sozinho conseguirá decidir dois pleitos eleitorais da poderosa nação. Reelegeu Bush em 2004 e garantiu a reeleição de Obama em 2012.

E assim continua a trajetória da grande Nação Mundial promovendo a Paz no mundo, invadindo países, matando pessoas, vendendo armas, fabricando Guerras.
Um dia chegaremos lá.

Afinal de contas... Como disse recentemente um amigo, como o mundo não tem mais jeito, cada um garanta sua vida de prazer, e o resto...
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* [1] Números retirados do livro: "De Pernas pro ar" de Galeano.
 [2] Os outros números são de arquivos oficiais dos EUA divulgados no site http://www.wikileaks.ch/

domingo, 24 de abril de 2011

Mapas Rasurados

Meus contemporâneos que usufruem de um mínimo de lucidez - alguns amigos meus têm esse defeito - ao tentar compreender a realidade atual sentem-se cegos tateando caminhos em terras baldias, levando em mãos alguns Mapas Rasurados. 

Cegos, caminhamos felizes, por que temos os mapas. Nas manhãs de domingo sento-me com alguns desses amigos para ler um desses mapas. Cantamos músicas, nos abraçamos, e seguimos perdidos por nossos caminhos achados. 

A geração anterior acreditava que com os óculos certos e com Mapas adequados conseguiríamos encontrar os caminhos que conduziria a humanidade para uma realidade melhor. Tinham bons olhos, acreditavam em utopias, acreditavam no ser humano. Não enxergavam que: “O Homem, que, nesta terra miserável, vive, entre feras, sente inevitável necessidade de também ser fera.” 

Hoje, engolidos pela Grande Fera chamada Sistema Capitalista Neoliberal, alimentam a Besta com a qual antes lutavam... Outros não só alimentam com seus próprios corpos, seus corpos já se tornaram feras. O PT, Partido dos Trabalhadores é um claro exemplo. 
As pessoas não desejam Mapas, logo, a Sociedade do Consumo não os produz. No máximo produzem tapa-olhos para a cegueira coletiva não ficar tão evidente. Nessa sociedade sem Mapas, as pessoas caminham como rebanho, cada uma com o focinho no rabo da outra. Pessoas que são massa humana, negadas como sujeitos históricos, sem consciência libertária e sem um projeto de futuro, massa sempre manipulada pelas ideologias das elites. 

Com um mapa rasurado em uma mão, e segurando nas mãos dos companheiros de caminhada com a outra, sem enxergar bem os caminhos tentamos prosseguir ouvindo sempre às palavras daqueles que mesmo sem nenhuma luz conseguem enxergar caminhos: poetas e profetas. “O presente é tão grande, não nos afastemos. Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.” 

 (*) Imagem - Tela de Salvador Dali - [La Femme Nue dans le Desert]

domingo, 6 de março de 2011

Carnavais e Espiritualidades

Eu vou! O menino vira menina, o anão pode ser um gigante, homem vira mulher, sorriso estampado no rosto de todos que passam e que logo logo se transformará em euforia. Tristeza, a única restrição.  Os pés dos Deuses são desatados para brincar. Ao som de músicas alegres todos pulam, e pulam, e pulam. Fantasias que tentam trazer o avesso desse mundo pelo avesso. Queria que essas fantasias fossem eternas, quem sabe assim a paz venceria as guerras.

Carnaval, “a festa da carne", do latim clássico CARNEM LEVÁRE, substantivo que significa "abstenção de carne";indicando que deveria-se comer muito bem neste dia pois viriam os dias da abstenção, o termo fixa-se no italiano como CARNEVALE (XIV) e daí no francês CARNEVAL (1552) ou CARNAVAL (1680). Festa que nasceu na Grécia 600 anos antes de Cristo, comprovando que a vocação da humanidade para festas e celebrações é tão antiga quanto esta.
Quem diria que o carnaval é uma festa religiosa. O carnaval é a religião de milhares de foliões, mas não somente, o carnaval é rito religioso, um rito cristão.
Na Idade Média, uma corrente religiosa hegemônica passou a ver o mundo como uma tensão contínua entre duas forças opostas, o bem e o mal, e toda a realidade como desdobramento disso: Deus e o Diabo; céu e inferno; luz e escuridão; carne e espírito...

Como não poderia ser diferente o carnaval também recebe influencias dessa paranóia. A festa é uma preparação para a Quaresma, 40 dias de jejum e orações, que mortificará a carne e fortificará o espírito para a Semana Santa.  Carnaval é um fruto da inventividade e criatividade popular que apesar de cheios de fé e tementes a Deus sempre acham uma maneira de burlar a religião. Se a igreja obrigá-los-ia a 40 dias de privações precisariam de um dia de festas para atravessar essa tortura.
Infelizmente herdamos uma espiritualidade tetraplégica que exclui e nega o corpo, qualquer tipo de prazer é abominado, a sexualidade é reprimida, o carnaval a festa do corpo e do prazer é vista como coisa distinta de uma vida espiritual.

Perdemos duplamente: a espiritualidade perde a festa, a alegria, o riso, o gozo, o beijo, o abraço, o suor dos corpos, perde o tesão, perde vida, por isso é tetraplégica, perde partes de si mesma. Já a festa perde espiritualidade, perde solidariedade, perde paz, ganha cordas, ganha violência, segregação ...  A magia do colorido existe nos abadas e nas fantasias, mas os espaços dos "com pele de cor" são definidos.

Eu queria que essa fantasia fosse eterna, quem sabe um dia a paz vence a guerra! Eu queria uma espiritualidade celebrativa, como a de Jesus de Nazaré, que não negasse os espaços festivos. Queria festas movidas por uma espiritualidade sadia, onde todos festejassem a vida sem distinções, “seja tenente ou filho de pescador, ou importante desembargador”.

Essa visão de mundo dualista, que chegou até nossos dias, influencia parte do cristianismo a adotar uma espiritualidade bestial, incapaz de perceber o novo, o inesperado, o espontâneo. Produz pessoas neuróticas embebidas de uma moralidade que as paralisa diante da vida, alimentando-se do “EU SEI” constroem muralhas que os separam dos outros, do diferente e de si mesmos.

Difícil saber quem precisa mais de quem, se o carnaval da espiritualidade cristã ou se nossa espiritualidade do carnaval. Eu apostaria que precisamos mais do carnaval do que eles de nós por isso, Eu vou!

Eu vou! Atrás do trio elétrico vou! Dançar ao negro toque do agogô, curtindo minha baianidade Nagô! Eu queria que essa fantasia fosse eterna, quem sabe um dia a paz vence a guerra. E viver será só festejar!

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Caçador de Esperança

Estava conversando com uma amiga enfermeira, a melhor que conheço, fiquei bestificado com a forma que essa querida amiga usava sua fé para dar um belo e forte significado à sua atividade de cuidar das pessoas. Para Binha, “a fé é o firme fundamento da esperança”.
A esperança está no centro da pessoa humana, é aquilo que a move que a arremessa para a vida, a esperança de um mundo mais justo e solidário, a esperança que nossos sonhos e projetos se concretizarão.
Conversando com ela, nos lembramos de um amigo sonhador. Era um rapaz novo, cheio de sonhos e projetos, movido pela esperança. 

Sonhar é a capacidade de transformar a esperança em projetos de vida. 

Seus desejos de poder e seu coração cristão inclinado para a solidariedade o fez portador de sonhos mirabolantes. Esses sonhos o moviam. Queria ser capaz de transformar o mundo, ser parte de uma grande revolução econômica, política, social e de valores.
Logo viu-se só, devido a tamanha ingenuidade, mas traçou seu tímido caminho e seguiu. O caminho foi duro, mas cheio de aprendizados. Tentaram lhe mostrar um mundo no qual não era permitido sonhar, um mundo dado, pronto, realizado. 

Na saga bíblica, a revelação divina nos mostra como a sociedade tenta matar nossos sonhos, mas eles nunca conseguem, o máximo que os irmãos de José conseguiram foi jogá-lo em um buraco. A revelação é surpreendente, pois é exatamente isso que ocorre, a sociedade do capital não precisa de sonhadores, mas sim de peças e engrenagens que se encaixem em um de seus inúmeros sistemas: financeiros, industriais, de serviços e até religiosos. Nossos sonhos são logo jogados em buracos distantes e esquecidos da nossa alma, até pensamos que eles estão mortos, mas sonhos não morrem, estão sempre vivos, mesmo que nas profundezas da nossa alma.

Mas o efeito em nosso amigo foi outro, no caminho, conheceu a frustração de seus sonhos, mas isso não o derrubou. Prostrado olhou para o alto e iluminado teve sonhos ainda mais elevados, sonhou com coisa mais simples, no entanto tão complexo quanto o último, um grande sonho como lhe era comum. Sonhou em fazer sua amada feliz.
Sonhos impossíveis, mas que valiam lutar por eles. Utopias que nunca se realizariam, mas que o arremessava para cima. Horizontes distantes, que nunca alcançaria, mas que não o permitia parar de caminhar.
Todos os seus sonhos foram lançados em buracos, mas ele é caçador de esperança: Não permitirei que matem meus sonhos e projetos de vida. Nem serei medíocre a ponto de matá-los para viver confortavelmente o sonho dos outros, ou o inócuo projeto da sociedade do capital.
Meu amigo está a procura de sonhos mais simples, lá nos buracos da sua alma, aprendeu com os poetas a ver beleza nas coisas simples da vida.

Como disse Pessoa: Matar o sonho é matarmo-nos. É mutilar a nossa alma. O sonho é o que temos de realmente nosso, de impenetravelmente e inexpugnavelmente nosso.
Desejo morrer por algo que valha a pena morrer, e viver por algo que valha a pena viver.
Nunca permita que matem seus sonhos, quando eles se forem, você estará aí, mas deixará de viver.

Sonhe, ouse, lute, caia, levante, pense, tire a poeira,caminhe, trate as feridas, siga... 

Vale a pena viver! 

“Garanto que uma flor nasceu. É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto...”

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Conversa sobre Tempera, sofrimento e anjos!

Fui Torneiro Mecânico durante 10 anos da minha vida, orgulhosamente tenho a mesma profissão do presidente Lula...
Trabalhar como torneiro mecânico na área da PETROBRAS me ensinou coisas que carrego pra vida inteira. As principais foram: saber receber ordens; fazer greves; lutar pelos direitos dos outros; dar “nó”, (termo técnico para: “enrolar o chefe”); e fazer de tudo para não perder um serviço  (não há problemas sem soluções, primeiro diga que dá pra fazer, depois veja se dá mesmo. E se não der, dê um jeito, mas faça!).

Têmpera é um tipo de tratamento de metais. Com a têmpera podemos mudar suas características. O aço, por exemplo, tem em sua constituição uma quantidade x de carbono. A quantidade de carbono diz sobre a dureza e resistência do aço, quanto mais carbono, mais duro.

Como há pessoas frágeis, também há metais frágeis, os muito duros são frágeis porque se tornam muito quebradiços, e os macios são frágeis porque não tem resistência.
Quando o metal é muito macio, ele precisa ser temperado, este é submetido a altíssimas temperaturas e logo após um resfriamento brusco, com isto as moléculas de carbono tendem a ir para as extremidades do aço, tornando-o mais resistente em suas extremidades, onde ele precisa, pois é ali que vai receber o impacto.

O metal sofre para se tornar apto ao trabalho.

Em conversa com um amigo torneiro, ele me dizia que somos assim, precisamos sofrer para nos tornarmos aptos à vida. Quem não viveu momentos tristes que machucaram tanto que parecia q não iria resistir?

Ninguém deseja esses momentos, mas a verdade é que precisamos deles.

Meu amigo torneiro vem tentando aprender com os poetas, já consegue ver nas coisas tristes e nas pedras do caminho possibilidades de beleza e de alegria. Consegue ver a alma das coisas. Consegue sonhar. Entrar na realidade rompendo com a ditadura do real.

Disse-me que Deus foi muito bom com ele, pois sabendo que ele tinha que sofrer para aprender a viver, para ser resistente... mandou ela...

Ela era um ser incrível, era um anjo de Deus, quando o conheceu desobedeceu a Deus e veio viver com ele, queria viver como um humano. E foram felizes, mas logo veio o sofrimento, pq Anjos não são humanos... Anjos seguem regras, as regras os aprisionam... Por isso meu amigo torneiro sofreu, e sofreu, e sofreu...

_Mas ela era um anjo! Entendeu Gabirú? Deus foi muito bom pra mim, os momentos que vivemos foram mágicos, encantados, sublimes... Experimentei coisas que me marcaram para sempre, me senti perto de Deus. Ela se foi! Mas Deus a enviou para me tornar resistente, por isso sofri tanto.

Triste, meu amigo tomou o seu caminho, mas percebi claramente que ele era outro, mais forte e apto para enfrentar os mais árduos e penosos desafios da vida.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Eterno Retorno

Eia todo o passado dentro do presente!
Eia todo o futuro já dentro de nós! eia!
Álvaro de Campos
Yeaahh!!

Três horas da manhã, na companhia do silêncio e da solidão que tem se tornado um vício, foi quando me deparei com uma mente aflita, que em seus devaneios chegou à célebre e estúpida conclusão que o riso é tolice e que a alegria de nada serve.  O rico e sábio Salomão falou-me sobre os movimentos da vida, as estéreis rotinas do tempo, enfadonhas ensimesmadas repetições.

O sol se levanta, o sol se deita, apresando-se a voltar ao seu lugar e é lá que ele se levanta. O vento sopra em direção ao sul, gira para o norte, e girando e girando vai o vento em suas voltas. Todos os rios correm para o mar e, contudo, o mar nunca se enche: embora chegando ao fim do seu percurso os rios continuam a correr. Todas as palavras são gastas e ninguém pode mais falar. O olho não se sacia de ver nem o ouvido se farta de ouvir. O que foi será, o que se fez se tornará a fazer: Nada há de novo debaixo do sol! (1)

Quase 4 horas, o amigo de um amigo meu, Frederico Nit, ouviu a angústia do coração do sábio Rei, subiu uma alta montanha e de lá lançou ao vento duras palavras que alcançaram as mentes e os corações como um pesado martelo destruidor de ídolos.

Nit inquire

E se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: "Esta vida, assim como tu vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes: e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indivisivelmente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar, e tudo na mesma ordem e sequência - e do mesmo modo esta aranha e este luar entre as árvores, e do mesmo modo este instante e eu próprio. A eterna ampulheta da existência será sempre virada outra vez... (2)

E se??

Não te lançarias ao chão e rangerias os dentes e amaldiçoarias o demônio que te falasses assim? Ou viveste alguma vez um instante descomunal, em que lhe responderías: "Tu és um deus e nunca ouvi nada mais divino!" Se esse pensamento adquirisse poder sobre ti, assim como tu és, ele te transformaria e talvez te triturasse: a pergunta diante de tudo e de cada coisa: "Quero isto ainda uma vez e inúmeras vezes?" pesaria como o mais pesado dos pesos sobre o teu agir! (2)

Pobre sábio amigo, conheceu tudo mas nada entendeu. Pobre rico amigo teve tudo mas nada era seu.
Minhas amigas invejam Salomão, querem riqueza e poder, pobre amigas, “nada há de novo debaixo do Sol”.
Cada escolha, escolhas eternas, cada momento vivido, momentos que retornarão eternamente, nada novo, só o eterno retorno.

Seis horas da manhã, o velho e cansado amigo percorre sua vida sua história e nada encontra: “Fiz obras magníficas, construí palácios para mim, fiz jardins e parques, Acumulei prata e ouro, escolhi cantores, inúmeras mulheres, nada que fiz me agradou, viver a vida é como correr atrás do vento.” (3)


A vida? Ela re-começa todos os dias... Vivê-la é muito perigoso... A cada e a todo momento, escolhas que se eternizarão... 
Eiiii!! O que vc fará hoje? Vamos escrever uma poesia juntos? Quero dançar! Vem?

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1 - Eclesiastes 1.4-9

2 - Nietzsche, Friedrich. A Gaia Ciencia, Aforismo 341
3 - Eclesastes 2. 4-8


quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Sobre Deus, jardins e borboletas...

No princípio era um jardim, lá moravam a alegria, lindas borboletas e ela. Todas as tardes Deus descia do céu e passeava com ela, sua amada. Segurando em suas macias e frágeis mãos, mostrava-lhes as flores que havia plantado, cada uma um aroma especial, plantadas bem pertinho de um ribeiro de águas mansas e perenes, onde haviam passarinhos que entoavam canções de amor.

Um dia ela não quis mais passear com ele, queria espaço, queria pensar, ficar só. Os dias se passaram , a alegria se foi. Todas as tardes Deus esperava por sua amada, mas ela não voltava, então decidiu não mais ir àquele lugar que havia se tornado morada da solidão e da dor. No entanto para preservar o jardim, no qual viveu os momentos mais sublimes construiu um muro. "A tristeza é muro que separa jardins". E colocou  dois guardas para o proteger.

Mas ele deixou um sinal, as borboletas, na esperança que sua amada as vendo lembre-se do seu amor. E lembrando-se siga os passos do jardineiro que foi enviado para plantar caminhos, anunciando que tudo que foi ensinado, aprendido, determinado pelos Deuses ou por homens deve resumir-se em amar...

O desejo de Deus é amar e ser amado. O caminho de Jesus é o amor. Aquelas que amam conhecem a Deus... Quem não ama... Quem não se permite ser amada... Veja... Há borboletas...

Cecília Meireles escreveu um poeminha que diz tudo, o essencial, nada lhe falta...


“No mistério do sem-fim
equilibra-se um planeta.


E, no planeta, um jardim,
e, no jardim, um canteiro;
no canteiro uma violeta,
e, sobre ela, o dia inteiro,


entre o planeta e o sem-fim,
a asa de uma borboleta.”